Translate

Pesquisar neste blogue

[Opinião] O desencanto - Beatriz Serrano

                                   


 

Título: O desencanto

Série: -

Autor: Beatriz Serrano

Data de Leitura: 08/11/2025 ⮞ 15/11/2025

Classificação: 


Sinopse

«Brincar aos escritórios é fácil se soubermos como. O trabalho é apenas um papel que é preciso interpretar. Aprendi a dominá-lo na perfeição: domino as piadas que funcionam sempre para quebrar o gelo. Sei o que tenho de perguntar para parecer atenta e interessada. E sei o que tenho de dizer para que o tempo flua mais rápido sem fazer realmente nada até às seis da tarde.»

Marisa está na casa dos trinta anos e fartinha do seu emprego. A única forma de lidar com as provações e aflições da vida numa agência de publicidade é visitar o Prado depois de almoço, e também entorpecer os sentidos com um cocktail de ansiolíticos e vídeos intermináveis nas redes. Uma das razões pelas quais aparece no escritório é para poupar dinheiro em ar condicionado no calor sufocante de agosto em Madrid. Marisa detesta trabalhar, mas o emprego é a única coisa que lhe garante um ordenado para pagar a renda e comprar todas as coisas bonitas a que não resiste.

Durante a semana que antecede uma viagem «inesquecível» de team building organizada pela empresa, a ansiedade de Marisa dispara. Conceber passar um fim de semana inteiro com os seus colegas de trabalho é uma ideia insuportável, desencadeando a memória soterrada de um acontecimento traumático no escritório. Com o passar dos dias, a sua máscara social, incólume e polida ao longo dos anos, vai-se quebrando até rebentar com estrondo, ameaçando pôr toda a sua vida em desatino.

Este romance de pena afiada e humor na dose certa é uma seta que se espeta no leitor a cada palavra - é a nossa vida, enfim. Uma radiografia magistral das crises vividas por qualquer trabalhador, da solidão, da necessidade de relações e conexões humanas para encontrar uma luz de esperança que nos dê força para não nos atirarmos para a frente de um autocarro sempre que chega a segunda-feira de manhã.


Minha review no GoodReads


Afinal, a vida é muito parecida com qualquer motor de pesquisa da Internet: à medida que vamos tomando decisões, vão-se reduzindo as nossas possibilidades, até termos de escolher entre duas ou três e rezar para não nos termos enganado. Agora eu sou o meu próprio algoritmo (…).


O Desencanto, de Beatriz Serrano, é um romance leve na forma e pesado no que interessa. Lê-se rápido, sim, mas sem nunca perder profundidade. A escrita é simples, irónica, sarcástica, mordaz e com aquele humor que alivia sem esconder o que está à vista: uma protagonista a caminhar perigosamente no fio da exaustão.


Marisa tem trinta e poucos anos e trabalha no mundo da publicidade, numa agência da Gran Vía, em Madrid.

Head of creative strategy”, como ela gosta de dizer, embora a vida que leva seja tudo menos criativa.


É competente e responsável q.b., mas vive num quotidiano insípido, superficial e terrivelmente solitário. Detesta o emprego


Em todos estes anos de trabalho, também aprendi a dominar a arte de trabalhar o menos possível.


detesta a cultura corporativa


Os team building são outra parvoíce copiada de empresas americanas (…).


e detesta, sobretudo, a pose dos colegas sempre prontos para bajular quem convém.


Pela possibilidade de uma promoção, pela confortável sensação de uma palmadinha nas costas ou pela expectativa de se aproximarem de um peixe graúdo da empresa e demonstrarem, por fim, o valor que julgam ter dentro da mesma.


Sobrevive à custa de comprimidos para dormir, ansiolíticos e tutoriais absurdos do YouTube que a ajudam a fingir que está tudo bem.


O YouTube é a minha janela para um mundo em que gostaria de poder estar sempre presente.


O livro é, acima de tudo, uma crítica feroz ao capitalismo moderno e às suas versões açucaradas: a motivação tóxica, o culto da produtividade, a insegurança laboral permanente, o consumismo que promete sentido e entrega vazio. Fala da solidão, da ansiedade e do que acontece quando a vida profissional devora tudo o resto. Vale mesmo a pena passar os dias a trabalhar para deixar de viver?


Gostei do romance. Não me revejo totalmente no descontentamento da Marisa, mas reconheço partes dela — e suspeito que muitos se verão ali também. Por vezes é difícil admitir que não estamos bem.


Afinal, precisamos de poucas coisas na vida: alguém que nos ame, uma cama com grandes almofadões, umas latas de cerveja bem frescas e uns tomates que saibam a alguma coisa.


Achievement Bite-Size Books