Título: A Biblioteca do Censor de Livros
Série: -
Autor: Bothayna Al-Essa
Data de Leitura: 01/11/2025 ⮞ 09/11/2025
Classificação: ⭐⭐⭐
Sinopse
Uma sátira ousada e fantástica sobre livros proibidos, arquivos secretos e o olho vigilante de um governo omnipresente e todo-poderoso.
Há semanas que o novo censor de livros não tem uma noite de sono tranquilo. Durante o dia ocupa-se a passar a pente fino manuscritos de livros num gabinete governamental, à procura de qualquer pormenor capaz de tornar o livro impróprio para publicação - alusões a homossexualidade, a religiões não aprovadas, qualquer menção sobre a vida antes da Revolução.
À noite, os seus sonhos povoam-se de personagens dos clássicos da literatura, e os romances que vai surripiando empilham-se na casa que partilha com a mulher e a filha. Ao mesmo tempo que continua a ser atraído pelo canto da sereia das leituras proibidas, mergulha num mundo subterrâneo onde se cruzam combatentes da Resistência, uma livreira clandestina e bibliotecários fora-da-lei que tentam salvar a sua história e cultura.
Face à ameaça que a liberdade de expressão enfrenta globalmente e ao futuro sombrio a que o mundo está praticamente condenado, Bothayna Al-Essa combina a acerada distopia de 1984 e de Fahrenheit 451 com o absurdo descabelado de Alice no País das Maravilhas.
A Biblioteca do Censor de Livros é, ao mesmo tempo, um sinal de alerta e uma declaração de amor pelas histórias e o delicioso ato de nos deixarmos perder nelas.
Minha review no GoodReads
Logo no primeiro parágrafo
Um dia de manhã, ao acordar possuído por palavras que não eram suas, o censor de livros deu por si em cima da cama transformado num leitor.
dei por mim a pensar, e posteriormente a confirmar, isto é o início d’ A Metamorfose!!
Uma manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco insecto.
(PEA – tradução de J.A. Teixeira Aguiar)
Depois apareceram os coelhos, numa clara alusão ao Alice no País das Maravilhas, e quando surgiu o Vida e Andanças de Alexis Zorbás fiquei curiosa sobre como a autora iria juntar estas e outras obras num mesmo romance. E fê-lo, não de forma linear nem previsível, mas através de um mosaico de referências que fazem deste livro uma espécie de jogo de espelhos sobre a leitura, a censura e o próprio acto de interpretar.
Bothayna Al-Essa constrói uma distopia linguística e literária, onde o pensamento é perigoso e a imaginação uma ameaça ao regime. Ler não é um direito, mas um crime.
E o protagonista, encarregado de censurar livros, acaba por torna-se leitor. Há algo de muito kafkiano nesta inversão, com um toque de Fahrenheit 451, o absurdo de Carroll e o desencanto de Zorbás.
Gostei da história, embora a tenha sentido um pouco juvenil — talvez porque hoje em dia a juventude precise de ler sem grandes exigências, e a autora, professora que é, sabe moldar o discurso ao público alvo. A linguagem é simples o que torna a leitura rápida, mesmo quando a história parece perder-se em repetições ou pequenos desvios. Em certos momentos, senti que andávamos à deriva, entre metáforas demasiado explícitas e digressões que pouco acrescentavam ao essencial.
Mesmo assim, há algo de encantador no modo como Bothayna Al-Essa transforma o amor pelos livros num acto de resistência. O problema é que, quando tudo parece caminhar para a redenção, o final surge sem a centelha de esperança que esperava. Uma ausência que pode ser intencional, um aviso para sob novas formas de censura, mais subtis, mais cómodas, mas igualmente eficazes.
![]() |
| Kuwait |

