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[Opinião] Contos Da Montanha - Miguel Torga

    



Título: Contos Da Montanha

Série: -

Autor: Miguel Torga

Data de Leitura: 01/06/2019 ⮞ 19/06/2019

Classificação: 


Sinopse

Composto por 23 contos, neste livro Miguel Torga apresenta aos seus leitores textos que assentam mais em descrições do comportamento humano, das suas emoções e dos seus sentimentos do que em descrições de aspectos paisagísticos da zona geografica de que era originário o poeta. Citando alguns exemplos, em Maria Lionça, a personagem homónima personifica a ruralidade e a dignidade das mulheres transmontanas que, apesar de analfabetas, se impunham pelo respeito, pelos bons costumes e pela sua sabedoria popular empírica; em Bruxedo, a personagem Melra representa as superstições que, ao longo de muitas gerações, se foram enraizando na vida daquelas gentes, fazendo parte do seu dia-a-dia.

Mais um livro de belos contos escritos pelo poeta transmontano. Apesar de, tal como referia acima, estes contos terem uma forte componente humana, as descrições das serranias porque Torga era conhecido estão presentes e algumas bem marcantes até. Um livro onde as pessoas são os heróis e os sobreviventes da suas vidas de miséria, de fome e de sofrimento.



Minha review no GoodReads

Miguel Torga – 1907-1995 – foi um dos mais importantes escritores portugueses do século XX, destacando-se como contista e romancista. Deixou mais de 50 obras publicadas.

Nasceu numa família humilde, em São Martinho de Anta – Vila Real, aos 10 anos foi viver para o Porto, em 1918 entrou no seminário de Lamego, e em 1920 foi para o Brasil trabalhar numa fazenda de café pertencente a um familiar.
Regressa a Portugal em 1925, completa os estudos, em 1928 entra na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e estreia-se no mundo literário com um livro de poesias, Ansiedade .
Foi preso várias vezes devido aos seus escritos e impedido de sair do País pela PIDE.
Em 1967, assina um manifesto para a aprovação de uma lei da Imprensa, a abolição da censura prévia e a interposição de recurso no caso de apreensão de livros.
Não era simpatizante da ideia de União Europeia porque na sua opinião ela ofende o espírito patriótico e o ideal de Pátria.
Não era uma figura consensual, não gostava de ser visto com as elites que considerava pedantes e ocas, muitos consideravam que tinha mau feitio, um carácter duro e era forreta, mas era visto pela gente mais pobre como um homem de bom coração (dava consultas médicas gratuitas a quem não tinha posses).
Recebeu diversos prémios, e por três vezes (1960, 1978 e 1994) foi candidato ao Prémio Nobel da Literatura.

A minha primeira experiência com Miguel Torga não correu lá muito bem. Eram leitura obrigatória do 8º ano as obras Bichos e Novos Contos Da Montanha, e a coisa correu tão mal que foi um autor que entrou para a minha lista de “banidos”, mas isto na literatura é como no futebol: aquilo que é verdade hoje torna-se mentira amanhã, e lá fui ler Contos da Montanha para o meu projecto “Around the World in 198 Books” – País do mês: Portugal.

Agora, à distância do tempo, percebo que com a idade 14/15 anos dificilmente poderia ter gostado de ler um autor destes. Com aquela idade não tinha nem a maturidade nem o conhecimento da língua para apreciar a escrita torguiana.

Originalmente intitulado Montanha – 1941 – são 23 contos essencialmente rurais; retratam o quotidiano das aldeias portuguesas, os seus costumes, a sua cultura, a convivência entre os portugueses, e a grandeza e simplicidade da alma lusa; alguns com uma carga bastante grande de religiosidade, outros com muito humor, e outros ainda com ligações ao sobrenatural.

Todos os contos são muito bons, mas o mais inesquecível é Maria Lionça, uma mãe que transporta em seus braços o filho morto, uma Pietà de pedra segundo Miguel Torga.
Uma Mulher da montanha, analfabeta mas digna, que impõe respeito, uma Mãe corajosa, sofredora, fiel e resignada.

Logo no início do conto a descrição da aldeia de Maria Lionça é uma delícia.
”Galafura, vista da terra chã, parece o talefe do mundo. Um talefe encardido pelo tempo, mas de sólido granito. Com o céu a servir-lhe de telhado e debruçada sobre o Varosa, que corre ao fundo, no abismo, quem quiser tomar-lhe o bafo tem de subir por um carreiro torto, a pique, cavado na fraga, polido anos a fio pelos socos do Preguiças, o moleiro, e pelas ferraduras do macho que leva pela arreata. Duas horas de penitência.
Lá, é uma rua comprida, de casas com craveiros à janela, duas quelhas menos alegres, o largo, o cruzeiro, a igreja e uma fonte a jorrar água muito fria. Montanha. O berço digno da Maria Lionça.”

No youtube encontrei um vídeo - extraído de um programa, da Rede Manchete, sobre Portugal, 1987 - em que Miguel Torga fala um pouco da personagem mais memorável deste Contos da Montanha:

Agora é preciso arranjar tempo para reler Os Bichos e Novos Contos da Montanha.


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