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[Opinião] A Bela e a Fera - Clarice Lispector

   


Título: A Bela e a Fera

Série: -

Autor: Clarice Lispector

Data de Leitura: 20/03/2019 ⮞ 26/03/2019

Classificação: ⭐


Sinopse

Livro póstumo de contos, A bela e a fera apresenta ao leitor duas Clarices: a primeira, uma jovem aflita, com imaginação de extrema vitalidade, que, aos 14 anos, começa a inventar histórias e a escrever contos insólitos que têm como marca a expressão de intensos impulsos emocionais.


Minha review no GoodReads



Chaya Pinkhasovna Lispector (1925-1977) nasceu em Tchetchelnik, na Ucrânia. Em Março de 1926 os seus pais, fugidos do antissemitismo generalizado na Rússia durante a Guerra Civil, chegaram ao Brasil e fixaram residência em Maceió - AL. Foi nessa altura que o seu pai decidiu que todos mudariam de nome. Assim, Chaya Pinkhasovna Lispector, aos dois meses, passa a chamar-se Clarice Lispector.



A A Bela e a Fera é uma colectânea de 8 contos, que foi publicada, postumamente, em 1979. Seis dos contos são dos anos 40, e fazem parte das Primeiras Histórias (faltam os contros Trecho e Eu e Jimmy), os últimos dois são dos anos 70, e fazem parte das Últimas Histórias.

“A este volume, que antecedeu sua estreia em livro, juntei seus últimos dois contos, “Um dia a menos” e “A bela e a fera ou A ferida grande demais”, cujos manuscritos foram ordenados por Olga Borelli. Como originalmente não havia título para o livro, escolhi eu mesmo A bela e a fera.” – Paulo Gurgel Valente


São oito contos cujas personagens principais são Mulheres, românticas e ingénuas, e que sofrem algum tipo de abuso nos seus relacionamentos amorosos. Todos eles falam de escolhas, solidão, fantasias, conflitos internos, condição feminina e de epifanias. É curioso como Clarice, tão novinha – tinha menos de 20 anos quando escreveu estes contos -, consegue através de histórias simples e perfeitamente banais provocar-nos um desconforto que nos acompanha por alguns dias.


1940 - História interrompida – um conto triste, melancólico e trágico, em que uma mulher faz uma reflexão sobre o homem que ama.


A ideia de que eu estava sendo feliz me enchia tanto que eu precisava fazer alguma coisa, alguma bondade, para não ficar com remorsos. (...) “Eternidade. Vida. Mundo... Amor”?


1941 - Gertrudes pede um conselho – Tuda, a personagem principal, tenta encontrar uma perspectiva para a sua vida.


“Cada pessoa é um mundo, cada pessoa tem sua própria chave e a dos outros nada resolve; só se olha para o mundo alheio por distração, por interesse, por qualquer outro sentimento que sobrenada e que não é o vital; o ‘mal de muitos’ é consolo, mas não é solução.”


1941 - Obsessão - Cristina e como as suas inseguranças a levam a relacionamentos abusivos.


“Não posso, mesmo agora, lembrar-me do rosto de Daniel. (…) Sei que ele sorria, apenas isso. (…) É que ele me dominava de tal forma que, se assim posso dizer, quase me impedia de vê-lo.”


1940 - O Delírio - a incerteza


“– Não se assuste. O senhor teve muita febre, delirou... É natural que não se lembre do delírio... nem de nada mais.

Ele a encara desapontado.

– Ah, o delírio. Você desculpe, no fim a gente não sabe o que aconteceu mesmo e o que foi mentira...”


1940 - A Fuga - Uma mulher que apenas aprendeu a ser uma mulher casada


”Há doze anos era casada e três horas de liberdade restituíam-na quase inteira a si mesma: – primeira coisa a fazer era ver se as coisas ainda existiam.”

“Os desejos são fantasmas que se diluem mal se acende a lâmpada do bom senso. Por que é que os maridos são o bom senso?”


1940 - Mais dois bêbados


"– Ouça, vou dizer mais: eu queria morrer vivo, descendo ao meu próprio túmulo e eu mesmo fechá-lo, com uma pancada seca. E depois enlouquecer de dor na escuridão da terra. Mas não a inconsciência. (…)

De repente, ele tirou o palito da boca, os olhos piscando, os lábios trêmulos como se fosse chorar, disse:


1977 - Um dia a menos - Um dia a mais ou um dia a menos pouco fazem diferença na inexistência de Margarida Mil Flores de Jardim.


”Eu desconfio que a morte vem. Morte?

Será que uma vez os tão longos dias terminem?

Assim devaneio calma, quieta. Será que a morte é um blefe? Um

truque da vida? É perseguição?

E assim é.”


1977 - A Bela e a Fera ou A ferida grande demais - Quando duas classes sociais se encontram no calçadão de Copacabana. Ela, a dondoca, faz pela primeira vez na vida o exercício de ver a sua vida através dos olhos d’Ele, o mendigo, que apenas queria um dinheiro para comer.


”– Como é que eu nunca descobri que sou também uma mendiga? Nunca pedi esmola mas mendigo o amor de meu marido que tem duas amantes, mendigo pelo amor de Deus que me achem bonita, alegre e aceitável, e minha roupa de alma está maltrapilha... “Há coisas que nos igualam”, pensou procurando desesperadamente outro ponto de igualdade. Veio de repente a resposta: eram iguais porque haviam nascido e ambos morreriam. Eram, pois, irmãos.”