Título: O Continente - Vol. II
Série: O tempo e o vento #2
Autor: Erico Verissimo
Data de Leitura: 26/10/2017 ⮞ 08/11/2017
Classificação: ⭐⭐⭐⭐⭐
Sinopse
A trilogia O tempo e o vento, que inaugura o relançamento da obra completa de Erico Verissimo pela Companhia das Letras, é a mais famosa saga da literatura brasileira. São 150 anos da história do Rio Grande do Sul e do Brasil que o escritor compôs em três partes - O Continente, O retrato e O arquipélago -, publicadas entre 1949 e 1962.
O Continente, segundo o crítico literário Antonio Candido "um dos grandes romances da literatura brasileira", lança o leitor em plena ação, durante o cerco das tropas federalistas ao Sobrado do republicano Licurgo Cambará, em 1895, para em seguida retroceder um século e meio e mostrar as origens míticas e históricas do clã Terra Cambará. Acompanhando a formação dessa família, Erico nos apresenta toda a saga.
Em sua galeria de personagens há figuras fascinantes, comparáveis a grandes ícones da literatura nacional como Peri, Capitu e Macunaíma. A forte Ana Terra, o valente capitão Rodrigo Cambará, a sedutora Luzia Silva e o curioso doutor Carl Winter são alguns desses personagens eternamente vivos na imaginação dos leitores.
Desfilam no romance as disputas entre famílias pelo poder local, regional e nacional; as guerras de fronteira e as civis; a bravura dos homens e a tenacidade das mulheres; a pobreza de meios e a violência contra os desassistidos. Valores caros ao escritor entram em cena: a sobriedade, a liberdade e a coragem - que muitas vezes não está nos campos de batalha, mas na simplicidade do cotidiano e na resistência capaz de sobreviver aos desmandos políticos.
O projeto gráfico de Raul Loureiro e as ilustrações do artista plástico Paulo von Poser respeitam o espírito das primeiras edições de Erico Verissimo, acompanhadas meticulosamente pelo próprio escritor - que chegava a desenhar esboços de personagens e cenários. Além de ilustrar as páginas iniciais de todos os volumes, Paulo von Poser desenhou o mapa do Rio Grande do Sul que ilustra O tempo e o vento.
Minha review no GoodReads
E a história do Rio Grande do Sul e dos Terra Cambará continua.
Este volume abarca o período de 1850 a 1895. A estrutura é a mesma do volume anterior. Trechos do Sobrado são intercalados com três grandes capítulos: A Teiniaguá, A guerra e Ismália Caré.
Teiniaguá – Este título faz referência a uma lenda gaúcha (Teiniaguá ou Salamanca do Jarau). Ao longo do livro também se fazem referência a outras lendas gaúchas como Negrinho do pastoreio ou a lenda do Quero-Quero.
Continuamos a acompanhar as personagens do volume 1, e somos apresentados a Bolivar, filho de Bibiana e Rodrigo Cambará. Bolivar é bem diferente de seu pai, tem um feitio menos exuberante, menos valente e é muito influenciável. Bibiana, a mãe, consegue que ele case com Luzia, neta de Aguinaldo Silva - um pernambucano que se fixou por aquelas bandas e que ficou dono do Sobrado quando uma dívida de Terra não foi liquidada. Luzia é uma menina criada na cidade grande, que se sente atormentada e angustiada a viver em Santa Fé, e que tem uma personalidade sombria. Embora o casamento seja curto, mesmo assim nasce Licurgo.
Uma das personagens que mais gostei foi o médico alemão. É através dos olhos de Carl Winter que ficamos a saber muitas das histórias e também dos acontecimentos da cidade e das suas gentes. É o médico que nos conta a lenda da Teiniaguá e que a associa a Luzia, e também é ele que nos conta quem e como foi construído o Sobrado. É através da correspondência que mantém com um amigo de longa data, e que ainda vive na Alemanha, que ele faz também o perfil psicológico das personagens. Com um olhar de gringo (estrangeiro) e sempre muito engraçado vai passando informações da história gaúcha e do Brasil.
A guerra – Neste grande capítulo como pano de fundo a guerra do Paraguai. No Sobrado a guerra, entre Bibiana e Luzia, por Licurgo. Bibiana já no volume anterior era uma personagem muito forte, mas neste conseguiu evoluir ainda mais e representar a mulher gaúcha daqueles tempos, forte e batalhadora, leal e companheira, e o alicerce da família. Luzia é outra personagem fantástica porque embora gere ódio tem em muitas das suas intervenções uma lucidez pouco habitual para a época.
Paralelamente a estas “guerras” vamos acompanhando o crescimento de Licurgo. A sua educação é informal, orientada por Fandango um gaúcho que tem uma linguagem original e que lhe ensina a sabedoria popular dos homens do campo e muitos provérbios. Licurgo prefere passar o tempo na fazenda do Angico onde é mais livre.
Fandango é um pouco a continuação do espírito do Capitão Rodrigo, um homem livre e com alegria de viver.
“Eu não tenho pai nem mãe, nem nesta terra parentes. Sou filho das águas claras. Neto das águas correntes”.
“Pois eu não preciso de desculpa para me divertir. Quando estou com vontade de dançar, danço. Quando estou com vontade de cantar, canto. Este peito não conhece tristeza (…) Vocês não fazem nada sem muito discurso. Chô égua!”
Ismália Caré – Neste capítulo Licurgo já é adulto, cheio de ideias republicanas e abolicionistas, mas há passagens que nos remetem para uma certa ambiguidade não só ética como moral.
”Não achava nada agradável ver aqueles negros molambentos e sujos, de olhos remelentos e carapinha encardida, a exibir toda a sua fealdade e sua miséria naquela casa iluminada. O pior era que o Sobrado já começava a cheirar a senzala.”
”- Mas agora vossuncê vai casar, precisa deixar a china o quanto antes.
Ele permanecera silencioso.
- Promete?
- Não.
A conversa terminara aí.”
Há duas novas personagens interessantíssimas, o Baiano, Toríbio Resende, um fervoroso republicano, e o Padre Atílio Romano, um italiano de nascença mas brasileiro de coração, que é um defensor da miscigenação e da paz entre os diversos grupos.
Sabemos pela narrativa d'O Sobrado que Licurgo foi eleito intendente de Santa Fé. São as relações estreitas com o governo que atrairão o ataque dos magaratos, durante a Revolução Federalista de 1895.