Título: Negrinha
Série: -
Autor: Monteiro Lobato
Data de Leitura: 31/01/2019 ⮞ 06/02/2019
Classificação: ⭐⭐⭐⭐
Sinopse
Publicado em 1923, após o sucesso de Urupês, 'Negrinha' compõe um painel que vai da farsa à tragédia, do sarcasmo à compaixão, passando pelo drama pungente da filha de uma ex-escrava. Os personagens destes 17 contos são um retrato da população brasileira das décadas iniciais do século XX. Através deles, Lobato denuncia e desnuda os bastidores de uma sociedade patriarcal que deixa entrever os vestígios de uma persistente mentalidade escravocrata, mesmo décadas após a abolição.
Minha review no GoodReads
José Bento Renato Monteiro Lobato (Taubaté, São Paulo, 1882 - São Paulo, São Paulo, 1948) foi um contista, editor, romancista, jornalista e crítico literário brasileiro.
Apaixonou-se pelos livros ainda na infância e As Viagens de Gulliver foi uma das suas obras favoritas. Em adulto interessou-se pelas obras de Camilo Castelo Branco, José de Alencar, Machado de Assis e Euclides da Cunha.
Monteiro Lobato encontrou o seu maior êxito na literatura infantil. Quem não conhece O Sítio do Pica-pau Amarelo?!!
Paralelamente foi escrevendo para adultos e, em 1923, depois do grande êxito de Urupês, escreveu Negrinha.
São 17 contos (na minha edição) que retratam os vilarejos decadentes, a população brasileira do início do século XX e os bastidores de uma sociedade patriarcal e com uma mentalidade esclavagista.
A escrita é cuidadosa e simples mas estimula a dúvida, a reflexão e a crítica.
Destaco os contos:
Negrinha – 1920
Negrinha era uma pobre órfã de 7 anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados.(…) Pestinha, diabo, coruja, barata descascada, bruxa, pata-choca, pinto gorado, mosca-morta, sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa-ruim, lixo – não tinha conta o número de apelidos com que a mimoseavam. Tempo houve em que foi bubônica. A epidemia andava na berra, como a grande novidade, e Negrinha viu-se logo apelidada assim – por sinal que achou linda a palavra. Perceberam-no e suprimiram-na da lista. Estava escrito que não teria um gostinho só na vida – nem esse de personalizar a peste...”
Fascinação - Pedro Peres, 1909 Pinacoteca de São Paulo |
O Jardineiro Timóteo – 1920
“Um preto branco por dentro. (…) Timóteo era feliz. Raras criaturas realizam na vida mais formoso delírio de poeta. Sem família, criara uma família de flores; pobre, vivia ao pé de um tesouro. Era feliz, sim. Trabalhava por amor, conversando com a terra e as plantas – embora a copa e a cozinha implicassem com aquilo.”
Os negros - 1922
A trágica história de amor entre a filha de um fazendeiro e um empregado português.
“Nosso crime – que lindo crime: amar! – foi descoberto. E a monstruosa engrenagem de aço triturou-nos, ossos e alma, aos três...”
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Frio. Frio de geada, desses que matam passarinhos e nos põem sorvete dentro dos ossos.
– Mas, Liduína, que é amor?
– Amor? – respondeu a arguta mucama em quem o instinto substituía a cultura. – Amor é uma coisa...
– ... que...
– ... que vem vindo, vem vindo...
– ... e chega!
– ... e chega e toma conta da gente. Tio Adão diz que o amor é doença. Que a gente tem sarampo, catapora, tosse comprida, cachumba e amor – cada doença no seu tempo.
Uns caçam meninas bonitas, outros caçam negócios, outros caçam imagens e rimas. O Breno Ferraz caça boatos contra o governo...
– E eu, que caço? – perguntei.
– Antíteses – respondeu de pronto o Indalício. – Fazes contos, e que é o conto senão uma antítese estilizada? Eu caço otários, com a espingarda da psicologia.
Amor só teve um lá pela juventude (...) Um príncipe. Passou um dia a cavalo pela sua janela. Passou na tarde seguinte e ousou um cumprimento. Passou e repassou durante duas semanas – e foram duas semanas de cumprimentos e olhares de fogo. E só. Não passou mais – desapareceu da cidade para sempre.